Pelerson Penido Dalla Vecchia, mais conhecido como Peleco, recebeu a editora de DBO, Maristela Franco, para apresentar seu Grupo Roncador Participações (GRP), que tem um plano ambicioso de expansão; confira a entrevista!

Por Maristela Franco
Considerada, por muito tempo, a maior fazenda do Brasil, com 153.000 hectares de terras contínuas localizadas em Querência (MT), a Roncador já não ostenta este posto. Ela foi fracionada em três partes de aproximadamente 50.000 ha cada, a partir de 2021, durante o processo sucessório da Família Penido Dalla Vecchia, que havia herdado a fazenda integralmente de seu fundador, o engenheiro Pelerson Soares Penido. Agora seus netos Pelerson, Caio e Eduarda conduzem as três propriedades resultantes da cisão de forma independente e com estratégias próprias. O nome icônico e a infraestrutura central do megaprojeto ficaram com Pelerson Penido Dalla Vecchia, que herdou 53.041 ha. Nesta área, ele está criando a “nova Roncador”, que, apesar de menor, já se mostra altamente produtiva e sustentável.
Pelerson, mais conhecido como Peleco, recebeu a editora de DBO, Maristela Franco, para apresentar seu Grupo Roncador Participações (GRP), que tem um plano ambicioso de expansão. Da antiga propriedade – montada por seu avô nas décadas de 70 e 80, com recursos próprios e incentivos fiscais da extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) – ficou um legado empreendedor que Peleco faz questão de preservar, agora sob os princípios da “produção regenerativa integrada”. Esse sistema lhe rendeu, inclusive, um convite para integrar o Business 20 (B20), grupo seleto de executivos responsável por apresentar propostas da comunidade empresarial para os governos do G20, presidido pelo Brasil de dezembro de 2023 a novembro de 2024. “Fui o único produtor nesta gestão do B20”, informa Pelerson. Confira!
Maristela – DBO fez uma reportagem sobre a antiga Roncador, em 2009, quando você e o Caio estavam assumindo a gestão da propriedade, à época com 153.000 ha. O que aconteceu de lá para cá?
Pelerson – Naquele tempo, meu avô ainda estava vivo e a fazenda era do Grupo Serveng, que ele comandava do escritório em São Paulo. Aos 91 anos, ele já não podia viajar tanto para o Mato Grosso e nós fomos assumindo a gestão da Roncador aos poucos. O sistema de produção pecuária ainda era extensivo e precisava ser modernizado. Em 2008/2009, a fazenda tinha um rebanho de 90.000 cabeças e estávamos começando a intensificar, fazendo agricultura em 4.000 ha, investindo em cruzamento industrial, suplementação, descarte de vacas vazias, reforma de pastagens. A produtividade da fazenda melhorou muito. Em 2008, quando eu construí as primeiras linhas do confinamento, levei uma bronca do meu avô, que não acreditava na técnica. Depois, ele até ficou comovido ao ver o gado gordo.
Em 2012, após a morte do meu avô, minha mãe herdou a Roncador integralmente. Eu fiquei à frente da gestão, mas respondendo ao conselho da empresa. Neste período, o projeto de intensificação ganhou maior impulso: passamos a fazer IATF em larga escala, produzindo cruzados Nelore/Rubia Galega superprecoces para o projeto de carne do Pão de Açúcar; aumentamos bastante a projeto de ILP e firmamos uma joint venture com a SLC, à época para produção de soja, em 20.000 ha. Após o falecimento de minha mãe, em 2020, começamos o processo de partilha, que agora está praticamente finalizado. Minha irmã, Duda, decidiu manter a parceria com a SLC; o Caio também, reservando uma área para gestão própria; e eu dei continuidade aos projetos que já vinha desenvolvendo.
Maristela – O que é, hoje, o Grupo Roncador?
Pelerson – É uma holding (formada por mim, minha esposa e meus filhos) que detém os 53.041 ha herdados da antiga Roncador; metade da Fazenda Mantiqueira, em Pindamonhangaba, no Estado de São Paulo (a outra parte eu arrendei da minha irmã), uma empresa de mineração voltada à produção de calcário, alguns arrendamentos, um Centro de Serviços Compartilhados (CSC), 5%-6% da Raiar Orgânicos (produtora de ovos) e uma de participação no grupo de controle da CCR.
Maristela – O processo sucessório começou em 2021, porque está sendo divulgado somente agora?
Pelerson – Porque são necessários muitos trâmites legais para firmar compromissos entre os herdeiros, colocar tudo no papel, fazer revisão jurídica, assinar os acordos e efetuar as transferências. Gastamos dois anos nisso. Agora, está praticamente tudo concluído e achamos importante comunicar ao mercado, porque a empresa mudou, tem nova configuração e um projeto de expansão. Neste ano, por exemplo, com 1/3 da área original, eu vou abater cerca de 50.000 cabeças e colher 1,2 milhão de sacas de soja. O nível de intensificação é alto. Naquela reportagem de 2009, a antiga Roncador, com 153.000 ha, abatia 10.000 bois/ano .
Maristela – Como será o projeto de expansão da nova Roncador? Onde você pretende investir?
Pelerson – Numa parte da área (4.000 ha), vou instalar cerca de 150 pivôs de 200 ha cada, o que me permitirá fazer duas safras anuais de grãos (soja + milho) e uma de boi. Intercaladas com pivôs, também serão montadas áreas de pecuária. É um projeto de integração. A ideia é sempre ter gado no meio das áreas de agricultura, para facilitar a distribuição do esterco na lavoura. Também pretendo arrendar mais terras para alojar matrizes, porque quero aumentar a área plantada com soja de 17.000 para 20.000 ha. Hoje, tenho cerca de 21.000 fêmeas em produção, mas a ideia é chegar a 50.000, então, preciso de mais espaço fora da Roncador para fazer cria.
Compramos uma parte dos bezerros de terceiros, desde que passem por nosso processo de qualificação de fornecedores (sem desmatamento ilegal, trabalho escravo, listas de embargo etc). Temos um POP (procedimento operacional padrão) de compra muito rigoroso. Planejo ainda maximizar o confinamento e aumentar a área de terminação intensiva a pasto (hoje são 1.400 ha, que sustentam 40.000 cab/ano, com lotações altíssimas, de 10-20 cab/ha). Minha meta é abater, futuramente, 100.000 cab/ano. Outro projeto é explorar mais o esterco e aumentar a aplicação de pó de rocha nas lavouras. Aliás, nosso projeto de mineração está em franco crescimento.
Maristela – Quais são seus planos na mineração?
Pelerson – Temos duas fábricas. Uma é de calcário dolomítico, em Cocalinho (MT), que estava produzindo 300.000 t anuais em 2017, subiu para 980.00 em 2023 e deverá chegar a 2 milhões de t nos próximos dois anos. A outra fábrica é de calcário calcítico, em Nova Xavantina (MT), e passou de 100.000 para 500.000 t. Temos ainda mais três pontos de extração, em processo de estudo do minério e obtenção de licença para exploração. As fábricas em funcionamento, além de calcário, produzem brita e pó de rocha, um remineralizador com potencial imenso para uso na agricultura. Joguei na fazenda inteira, com resultados incríveis, porque esse produto permite rejuvenescer o solo e ainda reduzir a dependência de adubos químicos, cada vez mais caros. A mineração é uma atividade nobre, perfeitamente integrada à agricultura, sem ela não produziríamos nada, não haveria o MT de hoje. O remineralizador está me permitindo fazer “soja inteligente”.
Maristela – O que é exatamente isso?
Pelerson – Um produto sustentável, com uso mínimo de fertilizantes e defensivos químicos. Pensando em gramas/ha de princípio ativo, já conseguimos reduzir as aplicações de inseticidas em 14% (já temos uma biofábrica em funcionamento); quase não usamos fungicidas e conseguimos produzir 16% a mais de grãos, com menor custo. Nas áreas já maduras do Sistema Regenerativo Integrado Roncador (SRIR), que tem três camadas de palha em degradação, a temperatura no solo ficou 10 oC mais baixa, em comparação com áreas com menor cobertura. E a diferença de produtividade chegou a 15 sacas/ha.
Maristela – Foi esse sistema regenerativo que lhe garantiu uma cadeira no B20.? Como foi essa experiência?
Pelerson – Muito interessante, porque eu estava falando para o mundo; eram CEOs de vários países discutindo temas muito importantes para o planeta, propondo políticas e eu era o único produtor brasileiro participando. Pude apresentar nosso sistema regenerativo integrado. Ele passa pelos três pilares da sustentabilidade (econômico, social e ambiental), mas tem uma preocupação especial com a vida no solo, buscando manutenção de cobertura, revolvimento mínimo, diversidade de cultivos. Minha referência é a floresta, com sua alta ciclagem. Numa mão, tenho a tecnologia voando e, na outra, o resgate de conhecimentos essenciais. Isso é bom em todos os sentidos, inclusive para o clima.
Ser regenerativo, na minha opinião, é produzir bastante cuidando do solo; e está implícita a fixação de carbono. A ILP é fundamental nesse processo, porque favorece a agricultura e permite produzir muita comida para o gado. Por que o pasto degrada? Porque a lotação é maior do que a oferta de forragem ao longo do ano. Com a ILP, o produtor tem pasto de qualidade na seca (semeado após o colheita da lavoura) e ainda pode produzir volumoso para o período de transição. Neste ano, fizemos 50.000 rolos de feno, para as vacas, e 600.000 t de silagem, para engorda. O sistema é integrado mesmo.
Maristela – Qual a idade de abate dos animais?
Pelerson – As fêmeas são abatidas aos 15 meses, pesando 15@; os machos aos 18-20 meses, com 20-22@. Não temos recria, eles já são engordados após a desmama. É um modelo ultraintensivo que exige mais gestão. Faço aquisição estratégica de insumos (o milho já está comprado até a metade de 2025) e travo o preço de venda do gado na Bolsa. Trabalhamos com Angus, Nelore e a raça espanhola Asturiana de los Valles, que tem ótima conversão alimentar e fornece carcaças pesadas, com ótimo rendimento e pouca gordura, ideal para o mercado chinês.
Maristela – Qual é o nível de governança da empresa?
Pelerson – Bastante alto. Diminuímos em área, mas não em infraestrutura ou equipe. Continuamos com uma boa musculatura para crescer com responsabilidade. Fizemos uma grande reestruturação interna: temos um comitê financeiro, um comitê de pessoas, um conselho que entende nossa filosofia. Estou muito feliz com essa nova fase do Grupo Roncador.

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